NEY GOMES*
DEUS ENTRE HOMENS E MENINOS!
“Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos; mas que é isto para tantos?” (Jo 6. 9)
O que seria da vida sem a arte?
Verdade é que sempre que possível a gente coloca beleza nas coisas para fazer a vida ter um gosto de coisa especial. O Evangelho não foge a essa regra dos homens! Por vezes, ele é tão adocicado artificialmente que seu verdadeiro sabor se perde no meio de tantos temperos, de tanto corante e de tantos confettis (visto nos carnavais de Roma, que eram enfeites de açúcar). Misturar poesia com verdades é sagrado da atividade humana. Mas às vezes, essa mistura faz perder o sagrado de um modo nocivo ao exercício das dietas.
Deixando de lado toda essa mistura doce e colorida, percebemos a verdadeira mensagem embutida na “multiplicação dos pães e peixes”. Quantas canções, homílias e poesias fantásticas já não foram construídas com essa passagem Bíblica? Acho que o suficiente para viciar toda à nossa maneira de enxergar o texto! Ora, se “Pasárgada” é uma possibilidade por que eu deveria encarar os desamores da vida real? Se lá, diz Manoel Bandeira, eu tenho tudo o que quero?
“Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada...”
(Manoel Bandeira, Estrela da vida inteira, cit., p. 127)
A Passagem Bíblica da Multiplicação revela um milagre para atender o coração de homens, de pais e chefes de família. Uma verdade tão crua e tão poderosa, que se faz como o único milagre de Jesus a ser relatado de igual maneira pelos quatro evangelistas. O milagre não apenas deixa evidente a compaixão de Deus, ela também evidencia a diferença gritante que existe entre homens e meninos.
Um pai de família, um marido zeloso NUNCA seria encontrado com alimentos juntos a sua família faminta. Um pai tira da boca para alimentar seus filhos, sua mulher. É ele que sai de casa ainda de madrugada em Santa Cruz em direção a Niterói, pegando trens e barcas para trabalhar, produzir sustento e conforto para os seus sem ao menos de se importar com o cansaço da viagem e o custo disso para a sua própria alma e saúde. A fome e a miséria têm ao longo dos séculos sido a mais poderosa fonte de guerras, conflitos, enfrentamentos e mortes diversas. E eu posso afirmar sem romances que se Jesus não estivesse ali, coisas dessa natureza seguiriam seu curso normal. “Tenho compaixão da multidão, porque há já três dias que estão comigo, e não têm que comer”. (Mc 8. 2)
Chamamos romanticamente de providência o que a realidade chama de egoísmo, imaturidade. Em dias difíceis são meninos que retém coisas essenciais. E o mundo só sai da desgraceira em que se encontra quando os meninos crescem e se tornam homens. Um HOMEM morre na frente da sua família, mas não suporta ver a sua família morrer na sua frente. Meninos, por outro lado querem sobreviver, brincar mais um pouco. Os meninos não pensam em todos, em famílias, no mundo, eles pensam apenas em si mesmos: “Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos... ” (Jo 6. 9)
Após 3 dias sob ministração intensa, todos os homens se encontravam exaustos e sem os alimentos que levaram para o seguir Jesus. As centenas de fogueiras espalhadas por todo lugar apenas produziam uma fumaça sem cor, sem sabor e sem cheiro. Era um cenário sem grandes novidades como uma viagem pelo deserto, onde tudo o que se vê pela janela do carro é areia, areia e areia que parece não mais acabar! Não é por acaso que o único evangelista a dar o detalhe de que um “garoto” é o possuidor dos pães/peixes é João. João, naqueles dias também era um garoto e num ambiente desse, os garotos se veem, e os adultos buscam enxergar soluções.
Um menino bem ensinado, curioso, inteligente, mas sozinho no mundo (naqueles dias Jesus se esbarrou com muitos meninos assim – Lc 18. 22). Talvez filho de uma mãe idosa ou doente, talvez criado pelos avós, mas sozinho desde cedo. Se estivesse ali na companhia de um adulto certamente não seria encontrado com alimentos. Não é esse o atual problema do mundo? Meninos sozinhos brincando com brinquedos poderosos. Meninos grandes brincando pelo planeta de “Falcon, Rambo e G.I. Joe”. Meninas que são eternas Barbie`s em busca do Ken. Enquanto eles se divertem o mundo fica bagunçado como um pátio de escola na hora do recreio. Meninos não percebem que o mundo ao seu redor precisa de uma contribuição, se eles têm algo, precisam ser – como na passagem – encontrados: “E ele disse-lhes: Quantos pães tendes? Ide ver. E, sabendo-o eles, disseram: Cinco pães e dois peixes”. (Mc 6. 38)
Quantos romances, prosas e poesias não nasceram desse texto, de ignorar, de passar por cima dessa verdade. Mas aqui a beleza esconde a dura verdade que que meninos não transformam mundos, eles precisam crescer, à exemplo do próprio Jesus, que não morreu Deus-menino para o nosso bem, mas Deus-homem para a nossa salvação. O garoto não é a origem dos milagres (e eles nunca são), mas revela por que os milagres precisam acontecer.
Nesse teatro da vida cheio de luzes, cores e sabores, a gente precisa logo entender quem somos e no que estamos nos tornando. O mundo parece ficar cada vez mais bagunçado e ameaçador e não adianta jogar açúcar carnavalesca sobre isso para esconder a realidade. Cada vez parece haver mais meninos e menos homens. O mundo pós covid-19 é um mundo que precisa de mais solidariedade do que de vacinas. Na verdade, a vacina não vai ter muito efeito num mundo onde crianças não querem crescer.
Em 2021 a pergunta transformadora e poderosa é: onde eu estou diante das coisas que precisam acontecer para que todos estejam bem? Enquanto os adultos pensam nisso de modo diligente, as crianças continuam brincando sem se importar até mesmo com a própria fome. O mundo precisa de mais relacionamentos e menos casualidades. Por que homens pensam em tantas e tantas pessoas, mas meninos só pensam em brincar. “Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos; mas que é isto para tantos?” (Jo 6. 9)
Se queremos Deus precisamos crescer. Por que os adultos Jesus têm sempre consigo, mas os meninos Ele encontra por acaso.
Ney Gomes – 08/12/2020. Twitter@neygms
Tudo o que passou é experiência. O agora é relacionamento e o que está por vir é desafio.
*Pastor auxiliar dO Centro Evangelístico Internacional em Casemiro de Abreu/RJ
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